quinta-feira, 27 de novembro de 2008

MPF/MG pede fim da mineração de zinco em Vazante

21/11/2008 14h17

Pedido, feito em ação, se deve aos graves danos causados à saúde da população e ao meio ambiente.

O Ministério Público Federal em Uberlândia (MG) ajuizou ação civil pública pedindo a imediata paralisação das atividades de mineração realizadas pela empresa Cia. Mineira de Metais, no município de Vazante, região do Triângulo Mineiro.Segundo o MPF, a cidade de Vazante vive hoje "um inferno na terra. O rio que abastece o município está completamente poluído. A água não serve para beber e sequer pode ser usada para higiene pessoal. A população, destoando da média nacional, apresenta grande incidência de câncer de esôfago, intestino e do reto". A situação é tão grave que a fauna e a flora da região estão irremediavelmente contaminadas por partículas de zinco e chumbo, fator que tem causado a morte de centenas de animais.A ação, ajuizada contra a Cia. Mineira de Metais, que foi incorporada em 2005 pela Votorantim Metais, e contra seus proprietários, bem como contra a União, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), o estado de Minas Gerais e o município de Vazante, pede a invalidação das licenças ambientais que autorizam a extração dos minérios de zinco e dolomita. A invalidação deverá atingir ainda a portaria do Ministério das Minas e Energia e dos atos normativos do DNPM que permitiram a instalação e garantiram o funcionamento da lavra.Bombeamento de água subterrânea - O MPF quer a paralisação de todas as atividades de mineração, sejam elas de lavra ou pesquisa, bem como a interdição do local.A Cia Mineira de Metais explora e beneficia os minérios de zinco e dolomita extraídos da Mina Morro da Usina, que fica a cinco quilômetros da cidade de Vazante. O beneficiamento do zinco utiliza grande quantidade de água, que, depois, é lançada no Rio Santa Catarina, que, por sua vez, deságua no Rio Paracatu, um dos afluentes do São Francisco. Essa água, com alto índice de turbidez devido à presença de chumbo, ferro, alumínio, manganês, cádmio, arsênio e zinco em quantidade bem acima do permitido, já atingiu o aqüífero subterrâneo e contaminou a água que abastece a cidade.Os problemas tiveram início quando, para realizar a lavra subterrânea do minério (são extraídas cerca de 200 toneladas por dia), foram abertas novas galerias subterrâneas a 350 metros da superfície, atingindo-se o lençol freático. Milhares de metros cúbicos de água foram derramados, inundando a mina. A mineradora deu início, então, ao bombeamento dessa água, que é depositada em tanques para decantação e posteriormente é lançada no rio.O problema é que esse bombeamento, superior a oito mil metros cúbicos de água por hora, está causando zonas de depressão e afundamento no solo. Ou seja, além do rebaixamento do lençol freático, que causou o desaparecimento de lagoas e a extinção de nascentes, comprometendo o abastecimento de água potável da cidade, o bombeamento da água tem causado fenômenos conhecidos por dolinas.Dolinas são depressões circulares do terreno semelhantes a crateras. Técnicos da Universidade Federal de Uberândia, em inspeção realizada a pedido do MPF, constataram que o fenômeno vem ocorrendo na parte interna da área de mineração e no seu entorno, num raio de um quilômetro, já tendo sido constatado o surgimento de mais de duas mil dolinas. Se o rebaixamento do nível aqüífero tiver influência na cidade de Vazante, as depressões podem vir a ocorrer na área urbana, com conseqüências temíveis, como a destruição de casas e edifícios, podendo, inclusive, vitimar as pessoas que neles residem.Mas a mineração ainda polui o ar, com o lançamento, pela chaminé da área de processamento do minério, de sólidos particulados.Conivência e omissão dos órgãos públicos - Para o MPF, o estado de Minas Gerais, a União e o DNPM, ao renovar periodicamente as licenças ambientais para a Cia. Mineira de Metais e ao expedir autorizações para operação, agem com flagrante omissão, porque, mesmo sabendo da violação a dispositivos constitucionais que condicionam a exploração de zinco, aprovam sua localização, forma de exploração e concepção."É totalmente incabível o Poder Público aprovar a localização e manter a concepção desse empreendimento, atestando, inclusive, sua viabilidade ambiental, quando se sabe que a atividade tem causado graves danos ao meio ambiente, afetando sobremaneira a saúde e a integridade física dos moradores de uma cidade inteira e inibindo todas as demais atividades econômicas, que também são de grande importância para a região", indigna-se o procurador da República Cléber Eustáquio Neves.Segundo ele, "a Cia Mineira de Metais tem violado uma série de leis e regulamentos sem que tenha havido qualquer ação eficaz dos órgãos ambientais competentes no plano administrativo".Tratamentos de saúde – Na ação, o MPF pede, além da recuperação da área degradada e da adoção de medidas urgentes para a completa descontaminação da água fornecida à população de Vazante, a construção e doação de imóveis àquelas pessoas cujas moradias não oferecem segurança por se encontrarem na área de influência de dolinas e subsidências (outro tipo de deslocamento do terreno).Pede ainda que as empresas e seus responsáveis contratem, urgentemente, serviços de saúde para a realização de exames clínicos e laboratoriais, de média e alta complexidade, em todos os habitantes que se habilitarem perante a Secretaria Municipal de Saúde de Vazante, para identificar e quantificar os casos de contaminação por alumínio, manganês, zinco, cádmio, chumbo e arsênio.Se o pedido do MPF for aceito, os réus deverão arcar com todas as despesas e custos de internação em UTIs, de tratamento fora do domicílio, daqueles pacientes em que se constatar a necessidade de tratamento médico em razão de males decorrentes da poluição causada pelas atividades da mineradora.Por outro lado, no caso de paralisação das atividades, a Justiça também poderá determinar que sejam adotadas medidas para garantir a estabilidade no emprego de todos os trabalhadores da Mina Morro da Usina por, no mínimo, dois anos.O MPF espera ainda que os réus sejam condenados - inclusive os entes e órgãos públicos que se omitiram diante dos fatos - ao pagamento de indenizações por danos morais e materiais, por eventuais casos de invalidez ou morte, bem como por dano moral coletivo.Ação civil pública nº 2008.38.03.009551-5Assessoria de Comunicação SocialProcuradoria da República em Minas Gerais(31) 2123.9008

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Caiu na rede... é pescador!

A construção da Rede Solidária da Pesca
Por Karine Pinto e Felipe Addor

Está completando dois anos desde o primeiro contato entre os dois projetos
que foram as molas propulsoras para a construção da Rede Solidária da Pesca: a Pesquisa-Ação na Cadeia Produtiva da Pesca em Macaé (PAPESCA),
desenvolvido pelo SOLTEC/UFRJ, e o Projeto Peixes, Pessoas e Água (PPÁgua), hoje liderado pela UNIMONTES/MG. Naquele contato, o objetivo era trocar experiências e ver as possibilidades de ajuda mútua entre os projetos, tanto técnica quanto politicamente. Logo em seguida, no I Seminário da Rede, já pescamos o Projeto de Manejo de Recursos Naturais da Várzea Amazônica (PROVARZEA/IBAMA), que tinha uma experiência de mais de 10 anos no norte do país, pioneiro no trabalho com os Acordos de Pesca. A mistura deu tão certo que até hoje os três projetos não conseguiram se soltar do anzol.
Hoje, essa articulação nacional possibilitouo fortalecimento de um movimento
em prol da pesca artesanal em outros âmbitos. Na verdade, o que fomos percebendo
ao longo da construção da Rede é que estávamos frente a uma lacuna política no setor pesqueiro. Apesar de em todas as localidades encontrarmos colônias e associações de pescadores, ficou claro que para haver a construção de políticas públicas de âmbito local, regional e nacional para a melhoria das condições de trabalho e da qualidade de vida dos trabalhadores da cadeia produtiva da pesca e da aqüicultura fazia-se mister promover uma maior integração entre esses atores.
O espaço de discussão e decisão dessas políticas, tanto governamentais quanto não-governamentais, estava muito distante dos trabalhadores. Com isso, foram inúmeros os casos de políticas que não foram bem sucedidas no atendimento de suas necessidades.
Portanto, nossa (do SOLTEC/UFRJ) contribuição para a construção da Rede está lastreada no objetivo de se criar um espaço de discussão, articulação, troca de experiência e pressão política para que se consiga maior mobilização política e econômica para a melhoria
do setor pesqueiro no país. Não para os pescadores industriais, que foram, até hoje, os beneficiados pelas políticas governamentais. Mas para os pescadores artesanais, cujas famílias sobrevivem da atividade a gerações, e que tem enfrentado uma degradação econômica e social paulatina.
Temos conseguido atrair instituições fundamentais para a construção da Rede, como a Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (FIPERJ), a União das Entidades da Pesca Artesanal do Rio de Janeiro (UEPA), a própria Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca (SEAP/Presidência da República), além de diversas prefeituras, sindicatos.
No entanto, nossa utopia é que os trabalhadores da pesca e da aqüicultura tomem a Rede para si, sejam a força-motriz dessa Rede, até transformá-la num movimento legítimo de representação
dos pescadores. A UFRJ, cumprindo seu papel de contribuir para a construção de políticas públicas para o país, continuará dando apoio; mas passando o bastão do protagonismo para as mãos dos trabalhadores. Atingindo esse objetivo, certamente será um grande passo para que se consiga caminhar na consolidação de uma política nacionalmente articulada de sustentação da pesca artesanal no nosso país. Entre os desafios que temos, está o de conscientizar as pessoas da importância econômica e cultural que esses trabalhadores têm para o cotidiano das cidades, das pessoas e para a cultura do nosso país. Nada que uma boa roda de história de pescador não resolva.